Acidente que matou grávida na BR-364 expõe caos na saúde de Rondônia
Mortes evitáveis revelam o colapso da saúde pública no estado e a omissão histórica de seus governantes
A morte da jovem grávida na BR-364, enquanto aguardava socorro, escancara o que Rondônia se recusa a encarar há anos: o estado abandonou sua população à própria sorte. Não se trata de uma fatalidade isolada. É consequência direta de uma política de saúde pública sucateada, mal gerida e cada vez mais distante das necessidades reais da população.
Fernanda Lino Santos, de 19 anos, morreu na sexta-feira (18), em um acidente na BR-364. A ambulância que levava Fernanda colidiu com uma carreta carregada de soja. A gravidez dela era de risco, e precisava de cuidados médicos que só teria em Porto Velho. A ambulância saiu de Vilhena e colidiu em Candeias do Jamari.
Fernanda não foi a única vítima. Sua mãe, Silvana Ferreira Lino Rocha, de 40 anos, também morreu no local, assim como o motorista da ambulância, José Florêncio, e a médica Laura Maria Possa. Apenas o caminhoneiro e a enfermeira que acompanhava o transporte sobreviveram.
Vidas perdidas como essas, são negligenciadas nas rodovias da morte de Rondônia. São inúmeros os óbitos nas estradas de pacientes que saem das regiões mais distantes, enfrentam mais de 700 quilômetros vindos da cidade de Vilhena, por exemplo, buscar atendimento especializado nos hospitais de Porto Velho.
Sem saúde
Isso ocorre, porque o estado não construiu unidades hospitalares públicas de baixa e alta complexidade em todas as regiões do estado. Além do mais, existe uma fila interminável de pacientes aguardando, exames, consultas e cirurgias.
O Hospital João Paulo II, apontado por reportagem da TV Record como a pior unidade hospitalar do Brasil, é apenas o símbolo mais evidente de um sistema em colapso. Há anos o hospital opera além da capacidade, sem leitos suficientes, com equipamentos ultrapassados e profissionais exaustos, tentando manter em pé uma estrutura que desaba lentamente.
Porto Velho, a Capital, faz parte das cidades abandonadas no setor de saúde. Até hoje os gestores municipais que passaram, não construíram um hospital de referência.
Enquanto isso, o governo de Rondônia ensaia mais uma solução paliativa: terceirizar a gestão dos hospitais públicos. O que deveria ser debatido com seriedade e transparência virou uma jogada administrativa apressada, sem garantia de que vai melhorar o atendimento. Terceirizar sem resolver as causas da crise — falta de investimento, desvalorização dos trabalhadores, gestão ineficiente — é apenas empurrar o problema.
O Hospital de Urgência e Emergência Regional de Rondônia (Heuro) virou um engodo, após anúncios na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) , o contrato da obra foi cancelado. A previsão era de investir mais de 200 milhões na obra. Um fundo financeiro foi criado, mas os dados não são transparentes e não se sabe o que será feito com esse dinheiro.
A responsabilidade pelas mortes evitáveis em Rondônia tem endereço certo: está nas mãos dos que governaram o estado nas últimas décadas. Cada vida perdida por falta de ambulância, leito ou médico deveria pesar como crime de negligência estatal. É um descaso sistemático, normalizado por quem deveria zelar pela vida.
Os trabalhadores da saúde pedem há mais de dois anos a reestruturação do Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração. Não são pedidos salariais descolados da realidade — é o mínimo necessário para garantir permanência, motivação e dignidade para quem ainda insiste em servir ao público diante do caos.
É preciso nomear os responsáveis. O sangue que escorre pelas emergências sem estrutura, pelas ambulâncias que não chegam e pelos corredores lotados não está só nas mãos de gestores inábeis. Está nas mãos dos políticos e instituições que, ano após ano, ignoram relatórios, denúncias e o sofrimento de quem adoece.
A morte da jovem na BR-364 não foi um acidente. É um retrato. Um retrato do que o abandono estatal produz quando vira política de governo.
Melhor estrutura rodoviária
Outro debate que precisa ser feito é sobre a importância de melhorar e ampliar toda estrutura da BR-364. A concessão da rodovia no estado, leiloada em fevereiro de 2025 e vencida pelo consórcio 4UM/Opportunity, tem gerado debates intensos.
O projeto prevê investimentos de R$ 10,23 bilhões ao longo de 30 anos, incluindo duplicações, faixas adicionais e melhorias na segurança viária. O governo federal e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) defendem que a concessão trará modernização e eficiência à rodovia, essencial para o escoamento da produção agropecuária da região.
Entretanto, críticas surgem quanto ao modelo adotado. Integrantes da bancada federal expressaram preocupações sobre o cronograma de obras, o valor do pedágio e a participação limitada da população nas decisões. O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Rondônia (Crea-RO) também apontou inconsistências técnicas no projeto. Além disso, o setor produtivo teme que a cobrança de pedágio encareça o transporte e reduza a competitividade dos produtos locais.
O governo federal diz que o projeto inclui a duplicação de 107 km, construção de 190 km de faixas adicionais, 24 passarelas para pedestres, 90 pontos de parada de ônibus e 24 passagens de fauna.
Além disso, estão planejados três Pontos de Parada e Descanso (PPDs) para caminhoneiros e 14 bases de serviços operacionais, visando melhorar as condições de tráfego e reduzir acidentes. A expectativa é que a concessão gere aproximadamente 92 mil empregos diretos, indiretos e induzidos, contribuindo para o desenvolvimento econômico da região.